quinta-feira, 31 de outubro de 2019





                                                       DIA RUIM


                     Toda vez que eu faço algo, o meu companheiro (que se julga meu chefe), vem e me diz que não é assim. Mas não me explica como deve ser. Aí, êle faz tudo de novo, bem depressa com cara de chefe. Isso acontece todos os dias depois da janta. Os peregrinos devem lavar a louça. A cozinha é pequena e ele fica em pé no meio dando ordens. Fica tudo atravancado, não se consegue mexer direito nessas horas. Vou pro quarto e fico esperando a hora de arrrumar a mesa para o café do dia seguinte. Volto para a cozinha, quando o movimento diminui e participo da arrumação da mesa. Colocos os pratos de sobremesa, xícaras, copos, talheres, cestas de pães cortado em fatias, geleias, biscoitos... enfim, tudo o que faz parte do café da manhã. A essa altura, ainda tem gente lavando louça e panelas e o "chefe" ainda está lá dando ordens. Ele olha pra mesa e coloca os guardanapos de papel, com cara de "você não faz nada certo". Todo dia é isso. Então, acho que o meu serviço acabou. Volto para o quarto e estou me preparando para dormir, quando o "chefe" bate na porta e grita comigo:
                      - Você não faz nada! Eu tenho que fazer tudo sozinho enquanto  você fica no seu quarto! Venha fazer o café!
                      Eu rezo pra São Tiago - Dai-me paciência! Muita paciência! - Eu vou pra cozinha e tento explicar que havia muita gente, mas ele não me deixa falar. Enfim, num gesto extremo de piti, ele vai dormir e diz:
                      - Então faça o café sozinha!
                       Eu fiz. Odeio as cafeteiras, odeio as garrafas térmicas. Mas fiz. São três cafeteiras. Uma estragou no dia anterior. Só duas funcionam. Então temos que fazer café muitas vezes para encher duas enormes garrafas térmicas.
                       Eu sozinha com duas cafeteiras velhas e insuficientes para encher duas enormes e complicadas garrafas térmicas!
                      -  Sem pânico, ME, fica calma que voce consegue! - Eu fico calma, faço funcionar uma cafeteira e... não consigo abrir a outra! Por mais que eu tente, não consigo! Vou até o dormitório, Tem dois peregrinos acordados.
                       - Can you please open this for me?
                       Os dois tentaram e também não conseguiram. Escrevo um bilhete dizendo que nem eu nem dois únicos pregrinos acordados conseguiram abrir. Deixo a cafeteira no meio da bancada da cozinha, em cima do bilhete. Fiz café muitas vezes na mesma cafeteira até encher as horrorosas garrafas térmicas. Dormi feito pedra.
                                                                    ***
                        Dia seguinte, só digo  bom dia. Não sei se o piti passou. Da minha parte, estou de saco na lua! - Paciência ME! Só faltam quatro dias.
                        Limpo, lavo, passo pano, ponho roupa no varal, recolho a roupa do varal, dobro tudo, ponho tudo no lugar... Ele tenta puxar papo. Sou monossilábica. Não dou chance. Não quero mais briga! Só quatro dias!
                         Mas... não deixo barato. Planejo um texto legal sobre machismo.

                                                                    ***
                          Publiquei o texto sobre machismo no dia 11 de setembro. Ainda estava lá. Uma reflexão sobre a maneira como  me trataram. É impressionante como escrever é bom. Depois que a gente escreve, fica com a alma leve.
                          Agora já estou em Sampa. Já descansei bem, já retomei minhas atividades normais, então vou começar a postar minhas aventuras como peregrina no período de 17 de setembro a 7 de outubro. Como não havia internet nas cidades onde pernoitei, anotei as coisas interessantes num caderno e vou passar a publicá-las a partir de agora.

          Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                   Eulina