quarta-feira, 7 de agosto de 2019







                                               A CANÇÃO E O CANTOR




     Em 1958, eu tinha quinze anos. Minha cabeça, cheia de sonhos, tinha na frente um par de olhos curiosos, um nariz arrebitado, uma boca sorridente e atrás, longos, lisos, castanhos e esvoaçantes cabelos.
     Eu me apaixonava com muita facilidade. Desapaixonava também. Por um menino bonito que eu via passar, por um primo distante que só encontrava nos casamentos e enterros da família, por celebridades em geral.
     Dentre as celebridades, Marlon Brando era o meu maior amor. Meu travesseiro se chamava Marlon Brando. Eu sonhava muito com ele. Sonhos urbanos. Sonhos iluminados, com festas maravilhosas, viagens a países exóticos, lugares sofisticados, luxo, roupas chiques e eventos idem.  
      Mas ele tinha um rival. Era um cantor lindão, que fazia muito sucesso na época.  Eu também sonhei muito com ele! Sonhos secretos, envergonhados, porque ele era - se não morreu, ainda é - negro.
    Com o principal rival do Marlon Brando, o sonho mais recorrente, me transportava ao sul dos Estados Unidos, por volta de 1860, na fazenda Tara, onde ele era escravo e eu Scarlett O’Hara. Que lindo! Que romântico! Cenários maravilhosos! Fugíamos juntos, em meio a mirabolantes aventuras durante as quais, nos livrávamos dos perversos perseguidores e sempre que possível trocávamos beijos apaixonados e juras de amor eterno.
     Esses sonhos de tirar o fôlego, eram vividos intensamente, sempre ao som de um Long Play, que quase furou de tocar a mesma faixa. E até hoje, cada vez que escuto essa canção, me lembro da garota que eu era e da crença que tinha no futuro. Tenho saudade nem tanto da garota, mas muito da crença no futuro.
Canção: Jamaica Farewell.
Cantor: Harry Belafonte.

Tarefa: crônica contendo lembranças/sentimentos despertados por uma canção.




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