terça-feira, 27 de outubro de 2015






                                                         TREELYMPICS


                    Um finlandes, Mr. Mika Vanhanen, preocupado com o desflorestamento no mundo, inventou uma olimpíada de plantio de árvores. Fundou uma ONG chamada ENO (ENvironement On line), que premia com medalhas de ouro, prata ou bronze, os países que mais plantam ou se envolvem em campanhas visando a plantação de árvores.
                     No ano passado, a RVA percorreu todas as escolas do país, plantando árvores. Houve uma adesão de 99,6%, e St. Vincent ganhou a medalha de ouro. O trabalho todo foi feito por Selly, o vincentiano "faz tudo". Ele registrou todas as escolas para participar, contatou todos os diretores, conseguiu as árvores com o ministro da agricultura, depois foi de escola em escola levando os estudantes da RVA para fazer a apresentação e depois plantar as árvores junto com as crianças de cada escola. Ufa!  Os diretores da RVA só apareceram em duas ou tres escolas, quando havia reportagem, TV, etc. O país ganhou a medalha. Mas quem foi até Helzinqui receber não foi o Ministro representando o país. E também não foi o Selly que fez todo o trabalho. Foi diretora da RVA, que apareceu nas fotos e estufa o peito para falar sobre a Treelympics. O certificado e a medalha estão dependurados na parede do salão.
                       Neste ano, não está sendo diferente. Selly faz tudo e nós subimos na pick up, carregando a tralha toda e vamos de escola em escola plantar as trees. Selly fala com os diretores, nós damos a aulinha e depois vamos plantar com as crianças. Os diretores da RVA só apareceram quando houve representantes dos ministros da agricultura, da educação e/ou TV. Nesse dia, eu dei a aulinha e fui filmada. Gostaria de ter visto o programa, mas aqui não tem TV.
                        Parece tudo muito bonito, muito ecológico. E é. Plantar é bom, as crianças são interessadas, participam com o maior entusiasmo, os diretores e professores das escolas sempre nos recebem bem, nós temos a oportunidade de ver como é o ensino no país... Mas, (tudo tem seu mas), este país é uma floresta, as cidades são pequenas e todas ficam nas praias, ou em clareiras no meio da floresta! Pra que plantar mais árvores? Não seria mais útil uma campanha para ensinar a preservar as árvores?
                        Nas ilhas granadinas faz sentido, porque o solo não é tão fértil e eles não tem árvores frutíferas. Mas aqui, na ilha de São Vicente, em qualquer direção que a gente olhe a gente vê mangueiras, abacateiros, caramboleiras, goiabeiras, fruta pão... e nós estamos plantando mais!
                        Sei lá... está sendo tudo tão sacrificado, tanta trabalheira, tanto sol, canseira... será que não tinha alguma coisa mais útil pra gente fazer?
                                       
                                                               ***
                        Mas, tudo tem seu lado bom. Estamos conhecendo o outro lado da ilha de São Vicente. É igualmente lindo! Na hora do almoço, paramos em algum restaurante, pedimos a comida e a proibidíssima cerveja, que, com o calor que faz,  desce magnificamente! Depois entramos na pick up e vamos cantando até a próxima escola. Temos uma verba pro almoço. No recibo sempre constam sucos. Nunca ultrapassamos a verba e sempre bebemos suco! Selly é um companheirão!

                                                              ***
                         Algumas escolas são muito pobres. As salas de aula são enormes e comportam todas as séries primárias, usando o quadro negro como divisória. Um barulho infernal. Teve um dia que eu dei a aulinha em tres escolas dessas e minha voz foi sumindo... ninguém percebeu, porque eu tinha que gritar cada vez mais alto, pra voz sair normal... mas cansa muito.
                         As escolas particulares são melhores, mais bem equipadas, cada série tem sua própria classe. Mas em todas, as crianças são sempre bem educadinhas, a gente entra na classe e elas falam:
                         - Good morning, miss! - depois da apresentação, eles dizem:
                         - Thank you miss!
                         Muitas aulas são cantadas, a gente chega nas escolas e ouve a cantoria! Um barato! Numa classe em que fomos, o professor tocava um violão, para acompanhar a cantoria das crianças. Em outra, depois da apresentação, uma aluna foi até a frente e fez um pequeno discurso de agradecimento pra nós. Eu me surpreendi com os olhos cheios de lágrimas e um nó na garganta, muitas vezes...
                          Nunca vi crianças tão limpinhas! Todas tem uniformes! Arrumadíssimos! Meninas de saia pregueada, milhares de trancinhas no cabelo e meninos de gravatinha! Blusas branquíssimas!
Mesmo, no fim do dia, na hora da saída, os uniformes estão impecáveis. As professoras e os professores também tem uniformes. E eles não transpiram! É impressionante, porque nós que estamos com a camiseta da RVA, começamos o dia arrumados, mas a camiseta vai sujando, fica molhada de suor e chega ao final toda amarfanhada. Mas o povo daqui não transpira, e suas roupas permanecem limpas e arrumadas o dia todo!
                           Meus desenhos agradam. As crianças pequenas arregalam os olhos, prestam muita atenção... sempre perguntam quem desenhou? Uma menina veio correndo até o carro, quando já estávamos quase saindo e disse:
                           - Miss, when you came back here, can you draw a cat for me?
                           - Yes! I will draw a cat for you!
                           Essa me deu nó na garganta e  lágrimas nos olhos... Em outra escola, depois da apresentação, as meninas tinham feito um abanico na aula de trabalhos manuais. Uma delas foi até o jardim, onde eu estava aguardando o término da plantio das árvores, e me deu o abanico que ela tinha feito:
                            - Miss, this is for you!  - agradeci. Só não agradeci mais, por causa do nó na garganta.          
                           Dei a aulinha para uma classe de adolescentes, imaginando o tempo todo o que é que eles estavam achando.  A  minha aulinha e meus desenhos são para crianças pequenas. Então eu ficava olhando nos olhos dos adolescentes e vi que eles estavam se divertindo... pensando que "velhota engraçada, essa!"  Me dava vontade de rir, por causa do ridículo da situação... mas dessa vez eu era a professora, não podia rir.  Acho que eles já sabiam tudo o que eu disse, mas  se divertiram... e depois foram todos plantar as árvores!

                                                        DEI PITI

                    A gente sai muito cedo, por volta das seis da manhã, antes do breakfast.  Então temos que preparar sanduiches pra ir comendo no caminho. Teve um dia em que não havia queijo, nem pão suficiente para os sanduiches, então recebemos cinco EC dolares cada um para comer em Kingstown. Comemos no Mercado Municipal de Kingstown.
                    Na vez seguinte, os diretores também foram, porque queriam fazer um filme. Então, as colombianas foram no carro do Selly e Nadhia e eu fomos na pick up com os diretores. Quando chegamos em Kingstown, perguntei pra diretora, que lugar poderiamos comer com nossos cinco dólares, e ela respondjeu com cara de espanto:
                    - Voces não comeram ainda?  É muito mais barato comer em casa! Como voces se organizaram para comer? Voces precisam se organizar pra comer, antes de sair!
                    - Mas não havia comida, antes de sair! - e seguiu-se uma pequena discussão sobre a necessidade de se organizar, até que eu me enfezei e disse:
                    - Quer dizer que não vamos comer? Quem não se organiza não come?
                    Ela viu a minha cara e resolveu parar. Não dava pra estacionar na frente do Mercado Municipal, então ela sugeriu um supermercado que tinha estacionamento e lanchonete. Enfim, paramos lá e pudemos ter o nosso breakfast.
                     Fomos para a prineura escola e a apresentação foi filmada, documentada, havia gente importante. Dessa vez, uma das colombianas deu a aulinha. Quando acabou, os diretores ficaram com o carro do Selly e combinaram de nos encontrar em Kingston, às tres horas. Fomos todas para a pick up, e recomeçamos a visitar as escolas, falar sobre a Treelympics, carregar e plantar as trees, entregar certificados, fotografar, e voltar para a pick up para ir à proxima escola. Solão! Tudo muito quente, cansativo, suado, sacrificado...
                     Enfim, acabamos e voltamos para Kingston. As colombianas foram para o carro do Selly e Nadhia e eu ficamos na pick up com os diretores. Então, esperamos as compras da diretora, as providências das professoras... por aproximadamente uma hora. Enfim, partimos para mais duas horas de viagem. No meio paramos num posto de gasolina e depois num grande supermercado, para a diretora comprar mais coisas. Minha barriga roncando de fome. Mais uma hora no carro, e chegamos na hora da janta. Lavo as mãos e vou direto pra mesa. Quando chego na mesa...
                      - No food! - olho bem em todos os pratos e travessas vazias - No food at all!
                      Fiquei muito, muito brava. Me senti explorada! Trabalhar de graça e ainda não ter comida, ou ter que me organizar pra comer?!?! É demais! Peguei minha bolsa, que estava na frente da diretora e fiz uma retirada teatral, falando bem alto, pra todo mundo ouvir:
                      - No food! - Estava realmente me sentindo explorada, me senti uma escrava!
                      A jordaniana veio até o meu quarto e trouxe a sopa, que ainda não havia tomado! Até agora, quando me lembro, eu rezo pra ela em agradecimento. Eu me sento na mesa do corredor e começo a tomar a sopa. Cheia de pimenta. Mas tomo assim mesmo. Estou com fome. Daí a pouco, o professor venezuelano vem me trazer dois sanduiches de pão com ovo e queijo. Comi tudo.
E ainda fiz um discurso para o professor:
                      - Seven days per week, twenty four hours per day, hard work and no food is slavery!
                      No dia seguinte, não fui plantar trees. Greve de protesto. Aproveitei para descansar. Foi bom. Meus muitos anos de vida agradeceram.

                       Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                             Eulina


PS - EC dolar é Eastern Caribbean dolar. Com EC$2,70, a gente compra U$1,00.












                     

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