quarta-feira, 9 de dezembro de 2015





                                                             BEQUIA AGAIN

                             Minha turma que tinha inicialmente onze pessoas, foi diminuindo, diminuindo e agora só tem eu. O professor venezuelano e eu.  A próxima tarefa seria a de investigar como funciona o criadouro de tartarugas marinhas  e a estação de dessalinização de águas, na ilha de Bequia.
                              Fomos na terça feira passada.  Acordamos às 5,30, fomos de van até St. Vincent, tentamos ir ao médico pra examinar minha perna de novo, mas não foi possível. Depois fomos ao  ao porto e tomamos o ferry boat. Chagamos em Bequia na hora do almoço. Descansamos um pouco, almoçamos e depois fomos à estação de dessalinização. Bequia não tem nenhum rio. Toda a água utilizada na ilha é da chuva ou dessalinizada. Mas a estação estava fechada. Com cara de abandonada. Olhamos, tiramos fotos, apreciamos a paisagem e fomos embora. Fomos à praia. Caminho lindo, no meio do mato.  Na praia, após um longo banho de mar, secar ao sol e algumas cervejas e cigarros, voltamos caminhando pela trilha, ao longo da costa, apreciando o por do sol, com todas as cores do Caribe... e depois, a noite estrelada... Nós nos perdemos no caminho de volta pra casa.
                              Depois de subir e descer várias vezes, várias ruas próximas, finalmente encontramos a rua certa. Descansamos um pouco, tomamos banho e fomos jantar fora. Mais de tudo um pouco... e muitas, muitas estrelas! Bons papos, ótimos silêncios, bons amigos e com certeza, boas recordações de um dia vivido intensamente. Quando voltamos pra casa, nos perdemos outra vez, nas ruas escuras de Bequia. Nós caminhávamos olhando as estrelas... é claro que nos perdemos!
                              No dia seguinte, fomos ver as tartarugas. Muito triste, vários tanques, bem pequenos para tartarugas tão grandes. O tanque maior estava vazio. e os pequenos cheios. As tartarugas pareciam doentes e estavam com certeza esfomeadas, pois nadavam freneticamente em nossa direção. E não havia ninguem para explicar. Olhamos, tiramos fotos e fomos visitar uma ex aluna da RVA que gerencia o hotel em cujo terreno as tartarugas estão. Hotel chique, com certeza várias estrelas, tenho vontade de falar sobre as tartarugas e acho que o professor também... mas, sei lá por quais motivos, não falamos. Preguiça de falar sobre coisas sérias... Voltamos caminhando por uma estrada linda, apreciando as praias "encoqueiradas", as mansões dos ricaços, a cor do mar, e as borboletas do caminho. O problema foi minha perna. Quando eu caminho, ela incha e dói. Andamos bem uns tres ou quatro quilômetros, até que pegamos uma carona com um turista canadense bem falante. Ele nos deixou perto do Banco e, desta vez, não nos perdemos.
                               Quando passamos perto da escola, uma menininha, cheia de trancinhas, de uns sete anos, mais ou menos, veio em minha direção e disse:
                               - You have been here planting trees! - que lindinha, me reconheceu!

                                                                  ***

                             Contagem regressiva. Agora, faltam só duas semanas. Olho a vista pro mar, da porta do meu quarto. Quero deixar gravada na minha retina a cor do mar do Caribe. Da janela, vejo árvores floridas, no pátio interno. Se vou até o salão principal, vejo a grande montanha do vulcão e mais mar azul.
                              Quando vou a Kingstown, não me canso de olhar para cada pedaço de estrada. A estrada mais bonita e mais perigos que já vi. A cada curva, primeiro levamos um susto, depois vemos uma praia linda com areias negras, rodeada de montanhas e florestas magníficas.
                               E todos os vilarejos, são dignos de cartões postais. Casinhas super coloridas, todas com varandas enfeitadas de estatuetas de galos, cachorros, leões, ou vasos com flores. Bandos e bandos de crianças, sempre limpinhas, cheias de trancinhas... Festas nas ruas todos os sábados... Cerveja geladinha e cheiro de marijuana em todos os lugares... Soca music. Calypso. Reggae. Grandes traseiros femininos e rebolantes. Pequenos traseiros masculinos, também rebolantes.
                               E o céu! Meu Deus, o céu do Caribe! Como eu acordo muito cedo, dá pra ver o nascer do sol, com todas as suas cores... e à tarde temos outro espetáculo: o pôr do sol. Algumas vezes eu estava na praia, dentro d'água durante o por do sol. A água vai mudando de cor, passa do azul profundo para verde, vai clareando até ficar completamente dourada, antes de começar a escurecer. Não sei se as cores mais lindas são as do céu, ou as do mar!
                                E as chuvas fortes inesperadas, caem de repente, num dia de muito sol. Muitas vezes o sol continua brilhando com força durante a chuva. As chuvas duram cinco ou dez minutos. E cada chuva tem o seu arco íris. Nunca vi tantos arco íris na minha vida. Alguns tão pertinho, que dá vontade de correr atrás. Outros longe, enormes, riscando todo o céu com suas cores...
                               Vou sentir falta desta ilha linda, cheia de florestas e do povo alegre e amigável.

                                                                           ***
                               Frustrações. A gente não pode ter muitas expectativas na vida. Pelo menos, eu não posso. Sempre que espero alguma coisa, acontece outra. Não sei se com todo mundo é assim, mas comigo é sempre assim.
                               Então, eu esperava vir aqui para trabalhar com população. Sempre me imaginava ajudando num hospital, trabalhando numa escola, num centro comunitário, sei lá... mas imaginava um contato diário com o povo daqui. No entanto, o que encontrei foi uma fazenda, que está se formando de maneira orgânica e sustentável, totalmente mantida com o trabalho dos estudantes. Todos nós passamos a maior parte do tempo trabalhando na fazenda. A fazenda pretende ser um exemplo de vida para os vincentianos... o problema é que os vincentianos não vem até aqui. Só em ocasiões especiais. Não há um curso regular para eles, assim como há para estudantes do resto do mundo! Eu me lembro quando estive aqui em março, aconteceu um curso bem rápido para vincentianos, mas eles não se integravam com os outros alunos... Por que?
                               Hoje, só hoje, duas semanas antes de ir embora, eu tive uma aula sobre a história de St. Vincent, contada por um dos professores vincentianos. Primeiro um documentário, mostrando como vivem, mostrando a música, a dança, a religião, a cultura, e depois a aula. Foi ótimo! Mas muito pouco! Deveríamos ter mais acesso à vida, aos costumes, à cultura, à história...
                               Esse pouco contato com o povo local me deixa frustrada.

                                                                            ***

                               O resgate. ontem à tarde, por volta das quatro e meia, estavamos na praia, o casal de jordanianos e eu, quando os vincentianos que trabalham aqui passaram de barco e nos convidaram a ir com eles.
                                Meu Deus! Que ilha linda! fomos beirando a costa, vendo as montanhas cobertas pela floresta e alguns vales, por onde correm rios, pequenas praias com areias negras, ou a costa de pedras onde as ondas batem e formam cavernas... e o céu, no fim da tarde, já tomando todas as cores do pôr do sol, a água azul do mar virando verde... a gente nem sabia pra que lado olhar.
                               Depois de de uns quinze minutos, eles pararam o barco e um deles desceu com o snorkel. Nadou um pouco e voltou trazendo um rolo de cordas. Depois de puxar todas as cordas pra dentro do bote, colocou só a máscara, sem o respirador e mergulhou novamente. Fiquei olhando. O que está fazendo? Ficou bem uns dois minutos dentro d'água e voltou carregando uma âncora. Olhei pro fundo do mar, tinha um bote lá! Ele queria resgatar o bote!
                              Então, ele veio a tona  pediu para o amigo jogar o tubo de oxigênio, Com movimentos rápidos e precisos engatou a mangueira do oxigênio no bocal do snorkel
 e mergulhou, carregando o oxigênio debaixo do braço. Ficamos olhando, atentos. As águas claras permitiam que víssemos o barco no fundo. Por um momento, ele sumiu nas águas. O rapaz que ficou no barco jogou as cordas. O outro continuava sumido. Enquanto isso, nós olhávamos, quase sem respirar. O rapaz movimentou o barco. Sentimos um tranco e  o barco começou a andar devagar. O mergulhador apareceu, jogou o oxigênio dentro do bote e subiu. O barco andou mais depressa e o bote foi emergindo, até aparecer inteiro fora d'água! Batemos palmas! Eles conseguiram!
                            Trabalho realizado em conjunto, em silêncio, com uma precisão de movimentos admirável! Eles não trocaram nenhuma palavra, mas ambos sabiam o que fazer, a cada momento! Uma sincronização perfeita. E observando seus corpos, principalmente o do mergulhador, eu pude sentir a força e o vigor da juventude,  a cada movimento atlético,  a cada músculo retesado. Corpos negros brilhando ao sol, trabalhando em silêncio...  Caetano definiu bem:
                                                                       Beleza pura!
                                                                       Dinheiro não,
                                                                       A pele escura!
                                                                       Dinheiro não,
                                                                       A carne dura!
                               Voltamos pra nossa praia, navegando pelo mar dourado pelo por do sol, em estado de graça. A lembrança desse passeio de barco vai nos acompanhar pra sempre.

                                                                         ***

                                Prisão. É tudo lindo. Mas é uma prisão. Alguns colegas do outro curso querem passar o Natal em Bequia. Fizeram reserva na casa em que fiquei e estavam se preparando pra ir.     Porém, a diretora não permitiu.
                                Fez uma reunião de duas horas pra dizer que não, com muitas palavras, somos um time, blablabla uma comunidade, temos que partilhar todos os momentos,blablabla concordamos com isso quando assinamos o contrato  blablabla... todos sairam furiosos da reunião.
                                Meu Deus, por que será que acham que a gente não tem direito à uma vida privada?

                                Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                                          Eulina



















Um comentário:

  1. Quanto ao resgate só tenho uma coisa a dizer..
    Toda malícia, toda delícia... Ahuhauuah!!!
    São todas essas belezas e cores que fazem esse tempo na RVA valer a pena!!

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