domingo, 23 de agosto de 2015





                                                    ONTEM


                   Foi o dia mais aventuroso de todos!
                   Começou normalmente, com a tarefa minha e de Nadhia, de ir até Kingstown para entrevistar a fabricante de sabão orgânico e pedir que ela nos ensine a fabricar um detergente orgânico.
                    Outros estudantes tinham outras tarefas. Eramos seis no carro da RVA. Solão. Calor de rachar os miolos. Já chegamos cansados. Perguntei várias vezes onde e a que horas o motorista viria nos pegar. Ele não respondia, fingia que não entendia. Outros perguntaram a mesma coisa. Nada. Ele não colaborava. Ficamos vagamente combinados de nos encontrar às duas horas da tarde no mesmo lugar onde ele nos deixou.
                     Partimos para as nossas diferentes tarefas.A cidade parece um caldeirão do diabo! Nossas roupas ficam logo molhadas de suor. Entrevistamos a fabricante do  sabão e começamos a comprar as coisas da lista que trouxemos. Alguma lojas tem ar condicionado.  Numa delas, Nadhia está comprando chocolate, quando um senhor se aproxima. De onde voce é, o que está fazendo aqui em St. Vincent, onde voce está hospedada? Nadhia vai respondendo, meio encabulada com o sucesso que faz uma loira num mundo de negros, mas sempre com um sorriso, que é sua cativante maneira de encarar o mundo. Ele se afasta por um instante e logo em seguida, uma senhora vem atrás e fala para Nadhia:
                     - He is the Prime Minister!
                     - Eu chego nessa hora e Nádhia arregala seus grandes olhos e me pergunta em português;
                     - Lina o que é Prime Minister? - eu começo a explicar, quando ele volta:
                     - My princess, is this your mammy?  - Both from Brazil? I know your president, I am friend of  Dilma and  Lula! - explico que somos apenas amigas e ele continua olhando intensamente para Nadhia, dá um cartão pra ela, dizendo:
                     - Call me! Anything you want, you can call me at this number - escreve um número no verso do cartão - This is my private number call me I will answer myself, call me... e o papo iria continuar, mas chegou uma outra mulher de salto alto, vestido bem justo e peruca loira, e ele virou-se pra ela:
                     - My princess! - e continuou a conversa com ela.
                      Quantas princesas será que ele tem? Nadhia e eu saimos de perto. Observo que não houve nenhuma alteração no funcionamento da loja. As pessoas não parecem alvoroçadas com a presença do Prime Minister. Parece que ele tinha apenas uma assessora e um guarda costas. A senhora que nos contou que ele é o ministro e o negão enorme que forneceu o cartão pra ele.
                      Acabamos as compras e vamos embora, nos sentindo muito importantes, por ter o telefone privado do Primeiro Ministro!
                                                                  ***
                      Fomos almoçar e depois nos encontrar com nossos colegas para tomar o carro de volta. Péssima surpresa! O carro não estava lá. Telefonamos para o motorista. Ele disse que estava em outro lugar e que iria sair logo. Vamos andando depressa em direção ao local indicado. Um calor infernal. Estamos todos molhados, grudentos, cansados. O local que o motorista indicou é um supermercado. Tem ar condicionado. Ficamos na porta esperando.
                     Depois de algum tempo, telefonamos novamente. Ele disse que não havia lugar no carro então ele foi embora. E nem nos avisou! Que fazer? Resolver todas essas questões toma tempo! Tem o barulho das ruas, tem o sol, tem a dificuldade das línguas, dos sotaques... afinal éramos um inglês, uma chilena, uma eslovaca, uma dinamarquesa e duas brasileiras, todos suados e indignados,  Até chegar a uma conclusão, demorou! enfim decidimos o óbvio. Temos que tomar a van. Outra caminhada até o ponto de partida das vans.No caminho, um incêndio!  Paramos um pouco, os bombeiro já haviam dominado o fogo e estavam limpando o local! Vamos indo,  carregando os pacotes das compras. Longo caminho sob o solão!  Chegamos, Na van cabem quinze pessoas. Entram deszenove. Mais os pacotes. Ai meu Deus!
                      Viemos apertados pelas curvas da estrada, grudados uns aos outros dentro da van. Numa das últimas paradas, desceu uma mulher bem gorda, com duas crianças, que eu nem tinha visto! Então não éramos desenove pessoas, eramos vinte e uma! E mais os pacotes. Muitos pacotes.
                                                               ***
                      Chegamos exaustos. Nadhia e eu vamos à praia. Delícia! Ainda bem que existe a praia, o mar azul do Caribe.
                                                               ***
                       Depois da janta, banho tomado, vem aquela vontade de uma cervejinha... só de saber que é proibida, a vontade aumenta. Combinamos com uma das colombianas. Vamos fazer uma proibidíssima excursão noturna até o boteco da praia, pra tomar uma cerveja. A chilena falou que vai mais tarde.
                      Temos que sair no escuro, para que não nos vejam.  Imaginem a cena: a colombiana de vinte e dois anos, a Nadhia com trinta e eu de setenta e dois, andando no escuro,  sem lanternas,tudo por uma cerveja! Ainda bem que temos lua.
                     Mas,ainda temos que passar no galinheiro!  A colombiana está encarregada de fechar a porta do galinheiro, mas antes precisa contar quantas galinhas estão lá para saber se alguma fugiu. Vamos com ela  rindo da situação  e ela muito engraçada, vai reclamando:
                      -  No, no, no... jo no nessecito de chickens! Jo necessito de beer, cervesa, I hate chickens, I want beer!
                      A essa altura, gargalhamos. Ela entra no galinheiro:
                      - Uno,  dos. tres... no, galinas, no... chikens I hate you ... ten, eleven... quiero cervesa... hate galinas, jo no necessito de ustedes...  trinta e uno, trinta e dos... beer... finish.  Fourty two galinas. Fuck, there must be fourty four! Fuck, fuck, galinas, I hate you!
                      Minha barriga dói de tanto rir, tal o absurdo da situação! Ela apaga a luz do galinheiro, fecha porta e prosseguimos nossa jornada, quase sufocadas de tanto rir.
                      Estamos longe, já podemos acender as lanternas. Continuamos a caminhada, vemos a lua refletindo no mar, lindo, lindo lindo... Atravessamos o gramado do campo de futebol e estamos perto do boteco. Estranho. Não há nenhum som. Só o silencio da noite. Chegamos mais perto. Decepção. Boteco fechado. No beer, no cervesa!
                     Mas a noite está linda, lua, estrelas, reflexo no mar... resolvemos deitar no gramado para olhar as estrelas. Ainda davamos risada... quando ouvimos um estampido! Ai! O que é isso! O coração bate forte! Um tiro? Levantamos e eu acendi a lanterna pra olhar o mato, não sei pra quê, pois não ia dar pra ver nada mesmo. Passados alguns minutos, nos acalmamos e deitamos novamente, ainda dando risada. De repente, Nadhia diz:
                      - Meu Deus! Vem vindo um homem! Nós olhamos e ele vinha em nossa direção, carregando um machete - ai, coração pula, bate desgovernado, que fazer? Ele chega, e começa a conversar, com a colombiana, nos convida para uma festa em Chateaubelair, diz que seus amigos tem carro e que pode nos levar, nós dizemos que estamos esperando nossos amigos e que só queremos ficar ali vendo as estrelas, Nesse momento, ele se mexe e vemos claramente!
                      Não é um machete, é um fuzil! Meu Deus! E  agora, o que fazemos?  Nessa hora, chega a chilena que vinha mais tarde, ela não desconfia dele e começa a conversar normalmente. Minha cabeça dá voltas, penso desesperadamente em como sair dali... ai meu Deus... e agora? Aí, chega o carro com os amigos dele. Ainda bem que o campo é longe da estrada, se ele quiser forçar a nossa entrada no carro, vai ser um longo percurso, da tempo de gritar, de sair correndo, de fazer alguma coisa...
                     Os amigos gritam  alguma coisa sem sair do carro. Ele deixa cair o fuzil e vai até o carro. Assim que ele se vira, nós levantamos, para espanto da chilena que tinha acabado de chegar e saimos, caminhando bem depressa. Não corremos, mas andamos o mais rápido possível.
                      He has a gun! He shouted the gun! - eu disse, enquanto a colombiana explicava em espanhol... quando chegamos na curva da estrada e começo da subida, ouvimos gritos e começamos a correr, apavoradas. ainda bem que eles estão longe, correndo dá tempo de chegar até a escola...assim vamos, até que a colombiana fala ofegante!
                   - I lost my keys! I cannot enter in my room! - Ai meu Deus, temos que pedir a chave reserva e dar explicações...  os gritos silenciaram, paramos pra pensar... descemos um pouco, procurando a chave. Ainda bem que achamos logo. Ufa! Voltamos a caminhar depressa, Eu digo:
                    - We had gone with the colombian girl to count the chickens and the night was so beautiful, that we decided to go to the football camp just to see the moon, the stars and the sea.
                    Alibi resolvido, subimos. Ainda havia gente nos terraços conversando. Ninguém perguntou nada. Aos poucos o coração foi acalmando e eu acabei participando de todo o papo psico-filosófico, que sempre acontece nas noites de luar.
                    Essa noite, não consegui dormir! Conhecer o Prime Minister, correr pelas curvas da estradas apertada dentro de uma van, com vinte e uma pessoas! Transgredir regras, contar galinhas, correr de medo, procurar a chave, combinar um álibi... nem Roberto Carlos sentiu tantas emoções assim!
                    Uma explicação: todos os homens vincentianos andam com uma faca grandona chamada machete.
                    Mais uma vez, obrigada, meu super anjo da Guarda!

                                                                      ***
                    Pra terminar, só mais esta: eu fiz geleia de carambola. Eles colocaram na mesa de jantar e eu vi alguns comendo com feijão!

                    Voce já pode dizer eu li na tela da
                                                                         Eulina












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